Com novos casos registrados esse ano, e as mortes em São Paulo, novidades em relação à febre amarela ocuparam o noticiário nos últimos dias.
A principal delas foi a adoção da dose fracionada nos estados de São Paulo, Bahia e Rio de Janeiro -- em que uma dose antes destinada a uma pessoa será dividida e aplicada a pelo menos quatro.
Não há motivos para alarde, mas o Ministério da Saúde está adotando ações preventivas e aumentando os municípios que receberão a vacina, já que grande parte da população não está imunizada.
A vacinação era mais comum em regiões de risco, como a Norte. Com a chegada do vírus em áreas antes não afetadas, como o Sudeste, a vacinação de urgência se fez necessária e dúvidas sobre esse novo cenário podem surgir: como a proteção naqueles que não podem tomar o imunizante e a eficácia da dose dividida.
Para esclarecer algumas questões, o G1 consultou a Fiocruz, o Ministério da Saúde e os infectologistas Marcos Boulos, coordenador de doenças do estado de São Paulo, Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e Artur Timerman, presidente da Sociedade Brasileira de Dengue e Arbovirose. Confira abaixo.
Onde a vacina está disponível?
Apesar dos novos casos, a forma circulante da febre amarela é a silvestre (originária de matas) e, por isso, o Ministério da Saúde está fazendo campanhas de vacinação apenas em regiões de risco.
Com novos casos e mortes, no entanto, o imunizante está sendo ofertado em novos municípios; e, em alguns lugares, como em São Paulo, a vacina será ofertada em todo o estado.
Confira a lista de municípios atualizada até dezembro de 2017 e a lista dos municípios que receberá a dose fracionada, conforme divulgado na terça-feira (9).
Quem pode tomar a vacina?
Crianças a partir de nove meses e adultos até 59 anos.
Quem pode tomar com restrições?
Pessoas acima de 60 anos e gestantes só devem receber o imunizante se não apresentarem nenhuma contraindicação e estiverem muito próximos a locais com casos relatados.
Indivíduos com HIV/Aids também podem desde que não apresentem imunodeficiência grave. Para isso, deve ser feito exame para contagem de CD4 (células de defesa), informa a Fiocruz.
Mulheres que estão amamentando devem suspender o aleitamento materno por 10 dias após a vacinação.
Quem não pode tomar a vacina, mesmo estando em regiões de risco?
Crianças menores de nove meses. Pessoas com câncer, indivíduos que passaram por transplante e pessoas com alergia grave ao ovo. Todos com deficiência no sistema imune também devem consultar um médico.
Como proteger bebês com menos de nove meses e pessoas que não podem tomar a vacina?
Nesses casos, devem ser utilizados métodos para evitar picadas de mosquitos e, no caso de viagem para área de risco, analisar a possibilidade de adiamento.
Para quem mora em região de risco, o uso de repelentes, telas de mosquito, blusas de manga comprida e calças, além da manutenção de portas e janelas fechadas podem ajudar a evitar a exposição.
Vale lembrar que o repelente é contraindicado para crianças menores de seis meses, que devem ser mantidas todo o tempo em ambientes protegidos por telas e mosquiteiros em regiões de risco, informa o Ministério da Saúde.
O que é dose fracionada?
Na terça-feira (9), o Ministério da Saúde divulgou que os estados da Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo vão adotar a dose fracionada da vacina da febre amarela.
Trata-se da divisão da dose antes aplicada: a dose padrão contém 0,5 ml e a versão dividida passa a ter 0,1 ml.
Com isso, uma vacina que antes era destinada para uma pessoa pode ser aplicada em quatro indivíduos – podendo chegar a cinco.
Confira os municípios que adotaram a dose fracionada.
Dose fracionada deve imunizar quase 20 milhões de pessoas contra febre amarela
A dose fracionada protege da mesma forma que a padrão?
Estudos da Fiocruz demonstraram que 0,1 ml da vacina (dose fracionada) garante imunidade contra a febre amarela por oito anos.
O período corresponde ao tempo de acompanhamento de pessoas que receberam a vacina em estudo. Com o passar dos anos, pode ser que a vacina tenha um período maior de eficácia.
Quanto à dose padrão, já se sabe que uma única dose protege para a vida inteira.
Por esse motivo, o Ministério da Saúde não descarta que aqueles que receberam a dose fracionada tenham que voltar para um reforço, mas isso vai depender de estudos a longo prazo.
Presidente da Fiocruz explica a eficácia do fracionamento da vacina contra febre amarela
Essa dose já foi aplicada antes? Ela é segura?
A dose fracionada ajudou a controlar um surto de febre amarela em Angola, em 2016. No Brasil, no entanto, é a primeira vez que a dosagem de 0,1 ml é adotada.
Estudos da Fiocruz também atestaram que a dose é segura. "Temos dados de estudo e uma aplicação real da vacina que mostram sua eficácia e segurança", diz Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
"É normal que, com o avanço do conhecimento, as doses diminuam... isso aconteceu com quimioterápicos e com o anticoncepcional, por exemplo, que tinham bem mais hormônios quando primeiramente utilizados", diz Kfouri.
Por que algumas pessoas vão tomar a dose fracionada e outra não?
Crianças de 9 meses a até 2 anos, pessoas com condições clínicas específicas (como pacientes com HIV/Aids), gestantes e viajantes internacionais vão continuar tomando a dose padrão.
Isso ocorreu por dois motivos: a eficácia da dose fracionada não foi estudada nessas populações e elas já não respondem muito bem à dose padrão.
No caso de viajantes, não há uma regulamentação internacional para a dose fracionada -- por isso, o governo continuará adotando a dose padrão nesses casos.
Já tomei a vacina padrão, mas faz mais de 10 anos. Preciso tomar um reforço?
Não. O Ministério da Saúde adotou em abril o padrão da OMS de dar a vacina padrão apenas uma vez, sem o reforço após dez anos que antes era recomendado. "Quem já tomou está tomado, é uma dose na vida, não há necessidade de repetição", explica a infectologista Rosana Richtmann.
Corre o risco de faltar vacina?
O fracionamento foi adotado porque já faltariam vacinas se fosse dada apenas a dose cheia. O Ministério da Saúde informa que, ao fracionar, vai garantir o fornecimento nas regiões de maior risco.
Timerman acredita que não há dúvida de que o Brasil vai ter de adotar a vacina universal em algum momento. "Descontando as pessoas que não podem tomar a vacina, isso daria 140 milhões de doses", diz.
Para Renato Kfouri, nesse momento também poderia ser pensado a vacinação para todos. "Mesmo na versão silvestre, a febre amarela já chegou na faixa litorânea e em regiões mais densamente povoadas. Temos gerações que não foram imunizadas porque antes não havia essa necessidade, mas agora seria algo a ser considerado", diz.
FEBRE AMARELA
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Doutora Ana Responde
Por esse motivo, diz Kfouri, a vacina contra a febre amarela passará a constar no calendário de imunizações, com todos os bebês acima de 9 meses recebendo a vacina. "A inclusão no calendário vacinal vai gerar imunização nas próximas gerações. Como nascem 3 milhões de brasileiros por ano, para esse número, há vacina", comenta.
A forma da febre amarela é urbana ou silvestre?
Não há indícios de que o Aedes Aegypti esteja transmitindo a febre amarela e, por isso, a forma da doença é silvestre (transmitida por mosquitos que ficam à beira do rio), explica Marcos Boulos, infectologista e coordenador de Controle de Doenças da Secretaria de Saúde de São Paulo.
Ele informa que o estado de São Paulo faz uma vigilância constante no Aedes para verificar sua capacidade de transmissão – e não foi encontrada a presença do vírus da febre amarela no mosquito.
“Se tivéssemos a forma urbana, teríamos muito mais casos, milhares”, diz Marcos Boulos. “Esse Aedes que chegou ao Brasil na década de 70 perdeu a competitividade com a febre amarela”, explica.
Também o Ministério da Saúde divulga que a forma da doença circulante no Brasil é a silvestre e que a forma urbana da doença (transmitida pelo Aedes) foi identificada pela última vez em 1942.
O mosquito Haemagogus leucocelaneaus, exclusivo de matas e ambientes silvestres, é vetor de febre amarela silvestre O mosquito Haemagogus leucocelaneaus, exclusivo de matas e ambientes silvestres, é vetor de febre amarela silvestre
O mosquito Haemagogus leucocelaneaus, exclusivo de matas e ambientes silvestres, é vetor de febre amarela silvestre
Quais são os sintomas da febre amarela? Como ela é transmitida?
As primeiras manifestações são inespecíficas (já que podem ser confundidas com outras doenças). Atingidos podem apresentar, no entanto, febre alta, calafrios, cansaço, dor de cabeça, dor muscular, náuseas e vômitos por cerca de três dias, mas a maioria das pessoas melhora após esse período, informa a Fiocruz.
Já a forma mais grave da doença é rara e costuma aparecer após um breve período de bem-estar (até dois dias), quando podem ocorrer insuficiências hepática e renal, icterícia (olhos e pele amarelados), manifestações hemorrágicas e cansaço intenso.
A doença é transmitida quando um mosquito pica um humano ou macaco infectado e, depois, com o vírus em seu organismo, volta a picar uma pessoa ou animal.